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Terras de Secura e Resistência: uma viagem aos Sertões

Podemos narrar de muitas formas as viradas de século. Esse jeito de inventar o tempo, em geral, é acompanhado de dois sentimentos: a nostalgia e a expectativa. Nenhum deles se relaciona a algo específico. Uma nostalgia sobre o que foi ou não vivido. Uma expectativa sobre tudo que se pode vir a desejar. No Brasil, podemos contar que o século XIX se encerra com a Guerra de Canudos e que o XX é inaugurado com Os Sertões, de Euclides da Cunha. Em Terras de Secura e Resistência: uma Viagem aos Sertões, Zilah Garcia (Olímpia, SP, 1967) atua em torno dessa atmosfera.

 

Canudos é inapreensível. Partindo com essa única certeza, a artista pôde ensaiar infinitos modos de representá-la, fazendo jus, também, às muitas raízes que sustentam a sua relação com essa cidade. A pesquisa, por ora, materializa-se nesta exposição-instalação, composta de quatro obras, sobre as quais Zilah se lança com terra e com diversas edições da epopeia euclidiana. São objetos, pinturas escultóricas e esculturas pictóricas, que resultam de um paciente processo de aprender a negociar com a umidade, que separa a terra-pigmento da terra-estrutura, e igualmente de ter as representações de Canudos como matérias a serem desbastadas e devoradas.

 

Existem muitas Canudos. Nesta mostra, a representação mais evidente com a qual a artista dialoga é a que foi feita por Euclides da Cunha, escritor e jornalista brasileiro que escancarou a barbaridade perpetrada pelo Estado e, ao mesmo tempo, a brava e eficiente resistência do povo de Canudos, que adiou o massacre total. Os Sertões é organizado em três partes: A terra / O homem / A luta. A primeira é dedicada à geografia de Canudos, parte com a qual Zilah Garcia mais se relaciona. A artista trata a seca e Os Sertões como matérias plásticas, semânticas e críticas. O semiárido nunca foi um problema em si.

 

Daniele Machado

2024

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